Como enxergamos pouco. Eu só observo quando sou obrigado a observar, ainda assim vejo.
A manhã era muito quente e todos a minha volta reclamavam. Sentei no último banco e fiz, o que à pouco, a mulher me pedira para fazer, aguardar.
Nunca gostei de esperar, desde muito novo eu me desesperava só de saber que teria que sentar e ficar ali, sem saber em que momento seria chamado. Isso chama-se ansiedade e pertence ao meu corpo, não é fácil deixar de ser um ansioso e o máximo que consigo é controlar as vezes... hoje eu estava controlando. Tentei me distrair com o bebedouro ao meu lado que deixava pingos de água cair lentamente e produzir um som suave. Fiquei preso naquilo pouco mais de um minuto e logo comecei a sentir o desespero começando a invadir minha perna esquerda que pisava, pisava e pisava, movimentos demasiado rápidos no chão.
Respirei fundo e a atenção sobre o bebedouro seria pequena de mais para eu me distrair novamente. Ouvi então, no fim do corredor, um chorinho de uma criança com menos de um ano de vida e era um choro muito parecido com o uivo de um lobo. Inclinei no banco para ver a criança. Era tão linda que me surpreendi com tamanha beleza. Estava aprendendo a andar e segurava na blusa da mãe quando desequilibrava-se e quase caia, quando isso acontecia ela logo começava a chorar e olhava a todos a sua volta com o rosto contraído pelas expressões do choro. Eu deveria ficar com pena mas isso a tornava uma criança muito sensível e bonita.
A voz feminina e forte chamou o nome que deveria ser da criança pois juntamente com a mãe as duas foram em direção da dona da voz. Eu fiquei olhando e sorrindo até ela entrar numa sala. Antes que a perna esquerda novamente começasse a socar o chão eu reparei como a pele de um humano muda. Algo que eu já deveria ter notado muito antes em minha vida mas fui saber só ali, notando uma senhora de mais de setenta anos. Ela aguardava silenciosamente na cadeira a sua vez. Olhava serena o vazio da sala cheia. Parecia muito cansada e com uma vontade enorme de não estar ali. Senti pena e acompanhei com os olhos todo seu corpo enrugado e flácido. Seus pés estava inchados e seu tornozelo coberto de varizes. Ao seu lado eu olhei a garota punk de uns treze anos e a diferença foi grande de mais. Os detalhes eram tantos que aquilo não ia me distrair e sim me deixar doido.
Ouvi um barulho ao meu lado e rapidamente me virei para ver o que era. Um garotinho lindo me olhava com curiosidade e quando encontrou meus olhos sorriu para mim. Então continuou tentando fazer sair água do bebedouro apertando com força o local por onde deveria sair o líquido. Eu não segurei um sorriso forte e mostrei para ele onde deveria apertar. Ele sorriu também e após tomar a água saiu correndo.
A voz feminina tornou a chamar outro nome e desta vez era o meu. Pronto, acabara a sessão de observar as coisas a minha volta. Ter que esperar os dias que pego uma senha e aguardar um atendimento para aprender tantas coisas maravilhosas chega a ser ridículo, eu deveria ser mais atento. Foi muito importante eu entender o quanto um corpo se modifica ao passar dos anos, como uma criança demonstra suas emoções quando se está aprendendo a andar, como o som da água caindo de um bebedouro é calmo e tranquilizante e como um contato visual as vezes pede ajuda e você nem percebe. Tudo isso aprendi apenas observando a minha volta em menos de cinco minutos. Imagina o quanto mais eu aprenderia se ficasse ali esperando mais de meia hora?
Para aprender tanto é mesmo necessário eu ficar esperando chamarem meu nome?...
Fanuel Ferreira
quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009
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texte!
ResponderExcluirFrango, como está interessante.
ResponderExcluirGosto deste jeito de fazer coisas simples se sofisticarem, realçarem seu conteúdo.
Também tenho vontade de ve-lo escrever sobre o hoje, sobre a fala, o pensamento, coisas que possam nos aproximar de seu dia-a-dia enquanto estamos longe.
Como é possível aprendermos estas coisas? Como será possível revelarmos este momento? É possível faze-lo? Faça-o.
Gosto sempre. Texte, teste, textual, tropula.
sim, precisamos encontrar formas de aproximação enquanto estamos longe... com certeza. Quero sempre descobrir como fazemos isso, sei que podemos. Obrigado pelas palavras, transformar coisas simples é o que mais me importa. não quero banalizar o meu redor pois isso faz toda a diferença ...^^
ResponderExcluirforte abraço!!